Depressão Perinatal: o que é, como identificar e quando buscar ajuda
- Luzia Maia
- há 4 dias
- 3 min de leitura
Atualizado: há 3 dias
A depressão perinatal é uma das principais causas de sofrimento psíquico entre mulheres que estão grávidas ou que acabaram de dar à luz. No meu livro Enfrentando a Ansiedade na Gestação, eu falo sobre como muitas dessas vivências são atravessadas por sintomas invisíveis, silenciados — e um dos mais graves é a depressão. Apesar de ser altamente prevalente, ela ainda é subdiagnosticada — e, pior, subtratada. Isso acontece, muitas vezes, porque os sintomas são confundidos com o “natural” da maternidade, ou porque a mulher sente vergonha de admitir que não está feliz durante uma fase que a sociedade espera que seja só alegria.
Se você é profissional da saúde perinatal ou acompanha mulheres nesse período, este texto vai te ajudar a compreender com profundidade o que é a depressão perinatal, quais sinais merecem atenção clínica e como podemos agir de forma ética e eficaz.

O que é depressão perinatal?
Depressão perinatal é um termo que abrange episódios depressivos que ocorrem durante a gestação e até um ano após o parto. Ao contrário do que muitos imaginam, ela não se restringe ao chamado "pós-parto". E mais: nem sempre se manifesta como tristeza intensa. Muitas mulheres relatam apatia, irritabilidade, culpa, insônia, pensamentos intrusivos e até sensação de desconexão com o bebê.
“É como se eu estivesse presente, mas não estivesse vivendo. Acordava todo dia com a sensação de que algo muito ruim ia acontecer.” — relato de paciente em acompanhamento.
Principais sintomas da depressão perinatal
Humor deprimido na maior parte dos dias
Irritabilidade ou labilidade emocional
Cansaço excessivo, mesmo após repouso
Falta de prazer em atividades antes prazerosas
Pensamentos de inadequação materna
Perda de apetite ou compulsão alimentar
Alterações de sono (insônia ou hipersonia)
Dificuldade de concentração
Pensamentos sobre morte (própria ou do bebê)
Importante: sintomas podem variar em intensidade e nem sempre a mulher verbaliza diretamente sua dor. A escuta qualificada é essencial.
O impacto da depressão perinatal
A depressão perinatal não afeta apenas a mulher. Os efeitos podem se estender para o bebê, para a amamentação, para o vínculo familiar e até para o desenvolvimento infantil. Não à toa, a saúde mental materna já é reconhecida como prioridade em políticas públicas de saúde, sendo abordada em diretrizes como as do Ministério da Saúde – Saúde Mental Materna. Os efeitos podem se estender para:
O bebê, por meio de prejuízos no vínculo e na responsividade materna;
A amamentação, que pode ser comprometida pela apatia ou insegurança;
O parceiro ou rede de apoio, que muitas vezes não entende o que está acontecendo;
O desenvolvimento infantil, principalmente quando há negligência emocional prolongada.
Verdade difícil: A maternidade não protege contra depressão — ela pode, inclusive, ser o gatilho
Existe um mito persistente de que o instinto materno e o amor pelo bebê seriam suficientes para evitar ou curar qualquer sofrimento. Isso é falso. A maternidade é uma experiência ambivalente, repleta de desafios. Se a mulher já tinha fatores de risco (como histórico de transtornos mentais, falta de apoio ou experiências traumáticas), a chance de desenvolver um quadro depressivo aumenta.
Negar isso em nome de uma romantização da maternidade só silencia ainda mais as mulheres que precisam de ajuda.
Como identificar e conduzir na prática clínica
1. Acolher sem julgamento
Evite frases como “mas você tem um bebê lindo, devia estar feliz”. O sofrimento perinatal é real, mesmo quando tudo “parece perfeito”.
2. Utilizar instrumentos clínicos com critério
Escalas como PHQ-9 podem auxiliar no rastreio, mas o diagnóstico é clínico.
3. Investigar o contexto
Histórico de depressão, traumas, violência obstétrica, perdas gestacionais, lutos não elaborados, suporte social deficiente, entre outros fatores, devem ser considerados.
4. Encaminhar quando necessário
Quadros moderados a graves exigem atuação interdisciplinar. Encaminhar para psiquiatria quando houver risco aumentado é cuidado, não falha.
Guia rápido para atuação clínica
O que observar? | Como agir? |
Choro frequente sem motivo aparente | Validar o sentimento e investigar possíveis gatilhos |
Sentimentos de inadequação materna | Trabalhar narrativas e expectativas irreais |
Falta de prazer ou conexão com o bebê | Explorar a construção do vínculo, sem pressão |
Pensamentos intrusivos ou autorreferentes | Avaliar risco e cogitar encaminhamento conjunto |
Apatia ou lentificação | Criar microações de reconexão com o cotidiano |
Escutar é intervir
Reconhecer a depressão perinatal é uma questão de saúde pública e de compromisso com uma maternidade mais real e menos solitária. Quando escutamos com atenção e agimos com responsabilidade, abrimos espaço para que essas mulheres possam pedir ajuda — e receber.
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Ambos são baseado em evidências científicas e voltados para profissionais que querem trabalhar com técnica e sensibilidade na saúde mental perinatal.
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